João J. Brandão Ferreira
«…mas havemos de nos
acomodar às situações que existem»
General
CEMGFA
(noticia da Lusa, de
31/12/11)
A Força Aérea vai começar o ano a perder cerca de 260 oficiais e sargentos, que pediram para abandonar o serviço activo, ou por terem atingido o limite de idade.
A Força Aérea vai começar o ano a perder cerca de 260 oficiais e sargentos, que pediram para abandonar o serviço activo, ou por terem atingido o limite de idade.
É uma perda
brutal.
Não conhecemos ainda os
números da Armada e do Exército, mas estes servem para ilustrar o
ponto.
Estes números vieram a público
por causa da saída inesperada do 2º Comandante do Comando Aéreo (CA). Esta saída
deve-se a um «desaguisado» interno que não é relevante para o grande
público.
Esta saída tem, todavia,
origem na decisão do anterior comandante do CA, há cerca de dois meses, em
retirar-se da vida militar e para o substituir ter sido indigitado um Major
General (duas estrelas), quando o cargo vence um Tenente General (três
estrelas).
Cabe aqui referir, que as
saídas previstas de generais e o inconcebível congelamento das promoções em
vigor, faz com que a FA tenha, neste momento, quatro generais: o chefe, o
vice-chefe e o Comandante do Pessoal. O quarto está fora do Ramo e há pouco
tempo na função.
Ora por alturas do Natal S.
Exª o Ministro da Defesa fez saber ao Chefe de Estado Maior que pretendia um
general de três estrelas no CA, restando saber as razões do senhor ministro ou,
o que é mais curial, quem tal lhe foi sussurrar ao ouvido e porquê.
Daqui decorreu a indigitação
de um general de três estrelas...
Para o lugar agora vago pelo
número dois do CA, marchou o Major General que o senhor ministro (ou alguém por
ele) não tinha querido como nº um. Já regressaremos a isto.
Especulou-se, entretanto,
porque é que tanta gente quer abandonar as fileiras e aventaram-se umas poucas
de hipóteses que podemos sintetizar na seguinte frase: já ninguém consegue
aturar o que se passa!
E o que se passa dava para
encher páginas, que vamos reduzir a meia dúzia de ideias, nenhuma delas aduzida,
aliás, na citada notícia da Lusa, baseada numa entrevista ao
CEMGFA.
Em primeiro lugar já não se
consegue suportar a continuada má relação político - militar de décadas e o
enfado, a acrimónia, a deslealdade e as ilegalidades com que os políticos, em
geral, têm tratado as FAs e os militares; depois o continuado ataque à condição
militar em todas as suas vertentes, que intentam destruir, por não lhes convir,
não entenderem, ou não acharem necessária; em seguida, porque os militares não
têm, há muito, hierarquia que os defenda; finalmente por não haver aviões para
voar, navios para navegar e homens para comandar!
Hoje em dia, só quem não sabe
ou gosta de fazer mais nada; não arranja emprego, ou ainda julga que pode
desviar o eixo da terra a fazer flexões de braços, é que permanece na
Instituição Militar. Quem tem condições pira-se (é o termo), num
fósforo!
As intenções governamentais –
e nisto o PSD/CDS têm-se revelado mais perniciosos e perigosos para a IM, porque
são mais metódicos e cínicos a fazer as coisas, ao contrário dos socialistas que
são desastrados a lidarem com fardas – devem ser, para já, como
segue:
Meter o Exército inteiro, a
três batalhões (menos), em Santa Margarida; a Marinha fica circunscrita ao
Alfeite (onde já está), com alguns pontos de atracagem espalhados pela costa,
ficando à espera que os navios encostem todos, à excepção de dois patrulhas para
a busca e salvamento; e reduzirem a FA a duas bases, provavelmente Monte Real
(que diabo a Nato até gastou lá uma palete de massa), e Beja, digo Montijo, já
que não dá jeito andar para a frente e para trás com o Falcon. E, claro, fazendo
migrar o comando da Defesa Aérea para Madrid…
Isto numa primeira fase;
imaginem o que será a segunda.
Voltemos agora ao CA para
analisarmos o facto – de gravidade inaudita – do MDN ter interferido
directamente nas atribuições de um chefe militar, neste caso, nas de gestão do
seu pessoal.
Não está em causa se a decisão
de nomear um determinado oficial para uma função, foi boa ou má – a função em
causa obriga, até, que a nomeação seja ratificada pelo Conselho Superior de
Defesa Nacional, o que ultrapassa o próprio ministro – mas sim a ingerência em
âmbito que não lhe compete. Ainda por cima com o desaforo das implicações que a
não autorização de promoções acarreta.
Tudo isto representou uma
desautorização do CEMFA e sobre isto mais não digo.
O passo lógico seguinte, a ser
dado pelo senhor ministro, será o de passar a colocar todos os comandantes de
unidades e por aí abaixo. Não, não corro o risco de ser acusado de lhes estar a
dar ideias, já há muito que estão mortinhos por fazer isso e só não põem um
«boy», ou uma «girl» lá deles, a comandar o Regimento de Infantaria de Viseu (em
tempo de paz, claro), porque é manifestamente difícil – embora não impossível.
Mas lá que gostavam…
Não contentes em terem
transformado os chefes militares, na prática, em figuras decorativas – por terem
vindo, paulatinamente, a esvaziá-los de todas as competências - ainda os querem
transformar em «quartos secretários» do Presidente da Comissão Liquidatária (da
tropa). E sabem que mais? Tenho esperanças de que se hão - de mostrar contentes
com isso.
A iniquidade miserável do
último despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Defesa, de 30/12 (que
faz regredir os militares à tabela salarial de 31/12/09), só encontra paralelo
na patética reacção (ou falta dela), da alta hierarquia militar, perfeitamente
incompatível com aquilo que se ensina aos cadetes, na escola!
Fomos todos postos de castigo,
voltados para a parede e com orelhas de burro.
Sem querer tirar a frase
citada, do CEMGFA, do contexto em que foi dita, mas extrapolando-a, pode-se
entendê-la como a síntese quase perfeita da atitude da generalidade da
hierarquia militar, desde 1982 [1] (depois de se terem zangado no dia 26 de
Abril de 1974): «havemos de nos acomodar às situações que
existam».
Nem imagina o senhor general o
alcance da verdade que agora lhe escapou.
Resta apenas saber o que
acontecerá quando houver alguém que não se queira «acomodar».