Daniel Pipes
No início de Agosto, com trombetas e tambores, a Casa Branca disponibilizou um documento com directrizes sobre os métodos para prevenir o terrorismo, alegando ter demorado dois anos para ser elaborado. Assinado pelo próprio Barack Obama com a retórica alardeando "a força das comunidades" e a necessidade de "melhorar a compreensão da ameaça que o extremismo violento apresenta", o documento parece anódino. Mas sob a capa, encontra-se uma abordagem contraprodutiva e perigosa quanto ao contraterrorismo. A importância desse trabalho consiste na sua firme posição no lado errado de três debates distintos sobre o contraterrorismo, com a direita responsável (e alguns liberais sensibilizados) de um lado e os islamitas, esquerdistas e multiculturalistas do outro.
O primeiro debate diz respeito à natureza do debate do problema. A direita responsável aponta para uma imensa ameaça, o islamismo, um movimento ideológico global que provocou cerca de 23 000 ataques terroristas no mundo desde o 11 de Setembro. Os islamitas negam que a sua ideologia gere violência e classificam esses 23 000 atentados como actos praticados por criminosos, loucos ou muçulmanos desorientados. Esquerdistas ocidentais e multiculturalistas concordam, trazendo sua formidável estrutura, criatividade, fundos e instituições para apoiar a negação da responsabilidade dos islamitas.
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Peter King |
Audiências realizadas este ano pela Câmara dos Deputados dos EUA ilustram esta diferença. Peter King (Republicano de Nova Iorque), presidente da Comissão da Segurança Interna, insistiu em lidar exclusivamente com a radicalização de muçulmanos. O democrata no mais alto posto no partido, Bennie Thompson do Mississipi, é uma excepção. Observa que "há uma variedade de grupos extremistas internos mais predominantes nos Estados Unidos do que os extremistas islâmicos, incluindo neonazis, extremistas ambientais, grupos contrários aos impostos e outros". Ele solicitou que as audiências sejam "um exame de base ampla sobre os grupos extremistas internos, independentemente de suas respectivas bases ideológicas".
King rejeitou o pedido, argumentando que "embora houvesse grupos extremistas e actos aleatórios de violência política através da nossa história, os atentados da Al Qaeda do 11 de Setembro e a ameaça permanente contra a nossa nação da Jihad Islâmica são singularmente diabólicas e ameaçadoras à segurança da América".
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Bennie Thompson |
O segundo debate diz respeito quanto à maneira de identificar o inimigo. Os partidos responsáveis e de Direita em geral, conversam sobre o islamismo, a jihad e o terrorismo, assim sendo, o relatório do Departamento de Polícia de Nova Iorque 2007, Radicalization in the West: The Homegrown Threat, (Radicalização no Ocidente: A Ameaça Autóctone) refere-se em sua primeira linha à ameaça "do terrorismo baseado no islamismo". Os islamitas e seus aliados falam sobre qualquer outro assunto - o extremismo violento, Al-Qaeda e as Redes Associadas (apelidada de AQAN), operação de contingência no exterior, desastres causados pelo homem e (o meu favorito) a "luta global pela segurança e o progresso". As forças do multiculturalismo realizaram profundas incursões: Uma inquirição do Departamento de Defesa dos EUA investigou o ataque em massa de 2009 no Ft. Hood realizado pelo major Nidal Hasan, que matou 14 pessoas e, o relatório a respeito, Protegendo a Força, não menciona o nome do terrorista nem reconhece sua evidente motivação islamita.
O terceiro debate diz respeito à resposta adequada. O público multiculturalista, da Esquerda Islamista, encontra a solução na parceria com os muçulmanos, juntamente com a ênfase nos direitos civis, processos justos, sem discriminação, boa vontade e impedimento de retrocesso. A Direita responsável concorda com essas metas, mas considera-as auxiliares à ampla gama de métodos militares e de imposição da lei, tais como espionagem, prisões, longas detenções, rendições, deportação, perseguição e encarceramento.
Nestes três debates encontra-se um relatório iludente da Casa Branca de 4.600 palavras, mal escrito, mal organizado, defendendo veementemente a posição islamita-esquerdista-multiculturalista.
A natureza do problema? "neo-nazis e outros grupos de ódio anti-semitas, de supremacia racial e grupos terroristas nacionais e internacionais".
O nome do inimigo? O papel em si jamais menciona o islamismo. Seu título, Fortalecendo Parceiros Locais para Evitar o Extremismo Violento nos Estados Unidos, evita mencionar até mesmo o terrorismo.
A resposta adequada? "Assim como respondemos às questões de segurança da comunidade [como a violência de gangues, tiroteios em escolas, drogas e crimes de ódio] por meio de parcerias e redes de funcionários do governo, prefeituras, policiais, organizações comunitárias e atores do sector privado, assim devemos abordar a radicalização para a violência e o recrutamento de terroristas por meio de relações semelhantes, aproveitando algumas das mesmas ferramentas e soluções".
Levantar questões de segurança comunitária revela a grave deficiência conceitual que o Los Angeles Times classifica como "implausível". O relatório elogia o "Modelo Abrangente sobre Gangues" do Departamento de Justiça, considerando-o uma estrutura flexível que "reduziu graves crimes relacionados a gangues". Bela notícia na batalha contra as gangues! Mas gangues executam operações criminosas e a violência islâmica é guerra ideológica. Membros de gangues são arruaceiros, os islamitas são fanáticos. Compará-los distorce o problema com o qual estamos lidando. Sim, ambos usam de violência, mas aplicar a técnica de um no outro é o mesmo que pedir aos pasteleiros que aconselhem o corpo de bombeiros.
A frase que começa com Fortalecendo, que reconhece o perigo do islamismo, e fixa-se num pequeno grupo, assevera que a"Al-Qaeda e suas filiadas e partidárias representam a principal ameaça terrorista ao nosso país". Ela ignora os restantes 99 porcento do movimento islamita que nada tem a ver com a Al-Qaeda, como o movimento Wahhabi, a Irmandade Muçulmana, Hizb ut-Tahrir, o governo iraniano, Hamas, Hisbolá, Jamaat ul-Fuqra, sem falar nos assim chamados solitários. A republicana Sue Myrick (republicana da Carolina do Norte) observa correctamente que o documento "levanta mais perguntas.... do que oferece respostas".
As raízes intelectuais do Fortalecimento tiveram início numa iniciativa fundada em 2004 por George Soros, o Promising Practices Guide: Developing Partnerships Between Law Enforcement and American Muslim, Arab, and Sikh Communities (Guia de Práticas Promissoras: Desenvolvendo Parcerias Entre os Agentes da Lei e as Comunidades dos Muçulmanos Americanos, Árabes e Sikh) por Deborah A. Ramirez, Sasha Cohen O'Connell e Rabia Zafar. Esses autores apresentaram a sua visão de forma inequívoca: "As ameaças mais perigosas nessa guerra [contra o terrorismo] estão arreigadas na bem sucedida propagação do medo e do ódio direccionados contra culturas e povos com os quais não estamos acostumados". A ameaça mais perigosa de todas, segundo o comunicado, não é o terror islamita, com os milhares de fatalidades mas sim um suposto preconceito amplamente difundido por americanos contra as minorias. Conforme destaquei em 2004, "O guia pode apresentar-se como ajuda ao contraterrorismo, mas o seu verdadeiro propósito é o de desviar a atenção da segurança nacional para privilegiar algumas comunidades em especial".
Embora o documento inquestionavelmente enfatize os valores constitucionais americanos e a necessidade de se fazer parcerias com os muçulmanos, não diz uma palavra sequer sobre a necessidade de se distinguir entre muçulmanos islamitas e anti-islamitas. O Fortalecimento refina o deplorável facto dos islamitas dominarem a liderança dos americanos muçulmanos organizados e que seus objectivos se identificam mais com os terroristas do que com o contraterrorismo. O temor justificado do republicano King de que o documento da Casa Branca condena a "legítima crítica no que diz respeito a determinadas organizações ou elementos radicais da comunidade muçulmana americana", algo imperativo para que se possa distinguir amigos de inimigos.
Realmente, a disposição da administração Obama em fazer parceria com muçulmanos que rejeitam a ordem constitucional explica as exultantes respostas das organizações islamistas a este documento. O Council on American-Islamic Relations (Conselho de Relações Americano Islâmicas), uma organização de fachada que apoia o terrorismo, tece elogios ao referido documento como "objectivo e holístico", o Conselho Muçulmano de Relações Públicas de mesma linha, considerou-o "muito útil".
Em contrapartida, Melvin Bledsoe, pai do convertido ao islamismo Carlos Bledsoe, que em 2009 alvejou e matou um soldado no centro de recrutamento militar em Little Rock, Arkansas, disse o seguinte: "Enquanto escamotearem, nunca irão resolver o problema". Ed Husain do Conselho de Relações Exteriores classificou-o de "pouco preocupante", tendo sido concebido principalmente com o intuito de "não ofender os muçulmanos".
Em suma, uma organização ligada a terroristas extasia-se quanto ao faz de conta da política contraterrorista da administração, enquanto o pai lutuoso de um terrorista desconsidera-o com escárnio. Isso nos diz tudo.
E agora, o que fazer com a consagração de um estudo ornamentado como política nacional? Não há atalhos: aqueles que desejam uma genuína política de contraterrorismo precisam actuar para afastar a esquerda e os multiculturalistas do governo.