quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Prémios Má Despesa Pública 2012

(Atribuíbos pelo blogue Má Despesa Pública)
Personalidade do Ano: Cavaco Silva
O exemplo tem de vir de cima. A Presidência da República não publica os contratos e os ajustes directos no espaço reservado para esse efeito na página oficial da própria Presidência. Após a publicação do livro Má Despesa Pública, no qual esta questão é destacada, a TVI24 decidiu fazer uma reportagem sobre o assunto. Na altura, a Presidência garantiu que iria passar a disponibilizar essa informação aos cidadãos. Os meses passaram-se e nada foi feito. O PR nem no facebook fala do assunto.

Autarca do Ano: António Costa
Têm-se sucedido os exemplos de falta de transparência na Câmara Municipal de Lisboa. Os contratos dos assessores políticos demoraram três anos a serem publicados, os gastos em iluminações de Natal duplicaram de um dia para o outro e informações simples como as ordens de trabalhos das reuniões do executivo municipal, resumos das actas, propostas, deliberações ou moções deixaram de ser disponibilizados no site da CML. Em nome do rigor.

Entidade Pública do Ano: Fundação Cidade de Guimarães
Num ano em que as fundações estiveram na berlinda e que se esperava uma nova ética dos seus responsáveis, eis que o presidente da Fundação Cidade de Guimarães, João Serra, se escusa a dizer a um jornalista quanto ganha de salário por mês. Como se não chegasse, a anterior administração está a exigir uma indemnização que pode somar dois milhões de euros. Entretanto, agora que a Capital Europeia da Cultura (organizada pela Fundação) está a chegar ao fim, começam a surgiu notícias de dívidas, atrasos e pagamentos. A novela promete.

Prenda do Ano: CP
Comboios suprimidos, greves que parecem não ter fim e o passe social sempre a aumentar. Mesmo assim, a CP lá consegue arranjar dinheiro para comprar pins de ouro e de prata. Os utentes é que deviam receber esta prenda.

Compra do Ano: Carro de Golfe do Banco de Portugal
O Banco de Portugal comprou um carro de golfe no valor de cinco mil euros. O Má Despesa quis saber onde é que se encontra localizado este carro de golfe e qual a relação entre o orçamento do Banco de Portugal e o grupo de golfe do Grupo Desportivo do Banco de Portugal. Ninguém nos respondeu, para (não) variar.

Concurso do Ano: Refeições da Assembleia da República
A Assembleia da República abriu um concurso para disponibilizar, pelo menos, 3 variedades de vodka, 16 tipos de whisky, 4 vermutes, 4 brandies e 8 licores. Uma vodka Eristoff sai a 2,05 euros e um Famous Grouse a 2,70 euros. Uma cerveja mini custa 45 cêntimos. E isto é só um pormenor do concurso para o fornecimento de refeições na AR, o qual não dispensa porco preto.

Subsídio do Ano: Associação de Ex-Deputados da Assembleia da República
A Associação de Ex-Deputados da Assembleia da República (AEDAR), segundo o orçamento da Assembleia da República, recebeu, só este ano, mais de 42 mil euros para a sua actividade. Isto para organizar passeios a Tomar e conferências do género «Como conviver com o seu corpo».

Frase do Ano: «Portugal não é um país corrupto»
«Digo olhos nos olhos: o nosso país não é um país corrupto, os nossos políticos não são políticos corruptos, os nossos dirigentes não são dirigentes corruptos. Portugal não é um país corrupto.» Cândida de Almeida, directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (01-09-2012)

Boy do Ano: Ana de Jesus Amaral da Câmara Pereira
Neste caso é uma girl. A filha de Gonçalo da Câmara Pereira recebe, da Câmara Municipal de Lisboa, mais de 23 mil euros, por um ano, para prestar apoio técnico ao Grupo Municipal do PPM. O pai é um dos dois deputados deste Grupo Municipal. Tudo em família.

Portugal no Seu Melhor: Presidência do Conselho de Ministros
A 31 de Janeiro o Má Despesa dava conta de que a Presidência do Conselho de Ministros tinha contratado Gonçalo Castel-Branco, por mais de seis mil euros mensais (72.618 euros num ano), para «serviços de consultoria técnica de conteúdos». Em pouco mais de 24 horas, segundo informação publicada no portal Base, este contrato transformou-se num outro contrato com o mesmo valor, mas repartido por três anos. É surpreendente, mas um dia bastou para multiplicar o prazo por três, apesar de o contrato original ter sido publicado em Outubro de 2011. É bom saber que na Presidência do Conselho de Ministros há leitores atentos do Má Despesa.

Viagem do Ano: Presidente do Município de Boticas e esposa foram a New Jersey
A Casa de Trás-os-Montes e Alto Douro de New Jersey, EUA, convidou o presidente da autarquia de Boticas e a esposa para participarem, em representação do Município, no seu 21.ºAniversário. O casal não hesitou e o município pagou 6.700 euros pela viagem para ambos, durante oito dias. Desejamos que o passeio tenha servido como um elixir conjugal, pelo menos.

Obra do Ano: Mais um centro cultura em Ponta Delgada
São, no mínimo, 400 mil euros que a Câmara de Ponta Delgada destinou para a construção do Centro Cultural de Fenais da Luz. Seria uma nota de rodapé na má despesa não fosse o facto de a ilha de São Miguel preparar-se para receber dois museus de arte contemporânea. São Miguel arrisca-se a ser a maior região do mundo com maior número de equipamentos culturais por metro quadrado.

Mistério do Ano: A empresa polivalente
O Fundo Para as Relações Internacionais, I.P. pagou mais de 20 mil euros por serviços de restauro de obras de arte a uma empresa de fabrico de artigos de desporto. O Má Despesa escreveu sobre o assunto em Fevereiro. Aparentemente, o ministro da tutela acha isto normal.

Bons Exemplos do Ano: Centro Hospitalar do Alto Ave e Junta de Freguesia de Airães
Num ano desolador para os contribuintes, o Má Despesa destaca dois casos de responsáveis por cargos públicos que estão conscientes do momento que o país está a atravessar. São exemplos de sacrifícios em nome do bem comum.
O Centro Hospitalar do Alto Ave vendeu em leilão os nove carros dos administradores, os quais renderam 56 mil euros. Os administradores também abdicaram das senhas de combustível e do uso de telemóveis de serviço para poupar 600 mil euros para aplicar em investigação.

Na Junta de Freguesia de Airães, Felgueiras, três dos eleitos abdicaram da remuneração a que têm direito por lei (274,77 euros no caso do presidente, pouco mais de 200 euros para o secretário e a tesoureira). Com esse dinheiro conseguiram comprar uma carrinha para o transporte das crianças que frequentam o centro escolar. Ainda sobraram 8500 euros para os cofres da Junta.


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quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Bento XVI sobre o «género»

 
«Não se nasce mulher; fazem-na mulher – On ne naît pas femme, on le devient».

Nestas palavras [de Simone de Beauvoir], manifesta-se o fundamento daquilo que hoje, sob o vocábulo «gender - género», é apresentado como nova filosofia da sexualidade.

De acordo com tal filosofia, o sexo já não é um dado originário da natureza que o homem deve aceitar e preencher pessoalmente de significado, mas uma função social que cada qual decide autonomamente, enquanto até agora era a sociedade quem a decidia.

Salta aos olhos a profunda falsidade desta teoria e da revolução antropológica que lhe está subjacente.

O homem contesta o facto de possuir uma natureza pré-constituída pela sua corporeidade, que caracteriza o ser humano. Nega a sua própria natureza, decidindo que esta não lhe é dada como um facto pré-constituído, mas é ele próprio quem a cria.

De acordo com a narração bíblica da criação, pertence à essência da criatura humana ter sido criada por Deus como homem ou como mulher. Esta dualidade é essencial para o ser humano, como Deus o fez.

É precisamente esta dualidade como ponto de partida que é contestada.

Deixou de ser válido aquilo que se lê na narração da criação: «Ele os criou homem e mulher» (Gn1, 27). Isto deixou de ser válido, para valer que não foi Ele que os criou homem e mulher; mas teria sido a sociedade a determiná-lo até agora, ao passo que agora somos nós mesmos a decidir sobre isto.

Homem e mulher como realidade da criação, como natureza da pessoa humana, já não existem.

O homem contesta a sua própria natureza; agora, é só espírito e vontade.

A manipulação da natureza, que hoje deploramos relativamente ao meio ambiente,torna-se aqui a escolha básica do homem a respeito de si mesmo.

Agora existe apenas o homem em abstracto, que em seguida escolhe para si, autonomamente, uma outra coisa para sua natureza. Homem e mulher são contestados como exigência, ditada pela criação, de haver formas da pessoa humana que se completam mutuamente.

Se, porém, não há a dualidade de homem e mulher como um dado da criação, então deixa de existir também a família como realidade pré-estabelecida pela criação.

Mas, em tal caso, também a prole perdeu o lugar que até agora lhe competia, e a dignidade particular que lhe é própria; Bernheim mostra como o filho, de sujeito jurídico que era com direito próprio, passa agora necessariamente a objecto, ao qual se tem direito e que, como objecto de um direito, se pode adquirir.

Onde a liberdade do fazer se torna liberdade de fazer-se a si mesmo, chega-se necessariamente a negar o próprio Criador; e, consequentemente, o próprio homem como criatura de Deus, como imagem de Deus, é degradado na essência do seu ser.

Na luta pela família, está em jogo o próprio homem.

E torna-se evidente que, onde Deus é negado, dissolve-se também a dignidade do homem. Quem defende Deus, defende o homem.


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