Escola de Sagres: organizada por D. Henrique, desenvolveu técnicas de navegação e a indústria marítima, porém a historiografia ignora a sua existência. |
Hugo
Dantas, Nova Portugalidade, 6 de Agosto de
2017
A História querer-se-ia a
investigação rigorosa da acção colectiva da Humanidade, ou das muitas
humanidades que a compõem, completada com o prudente e desapaixonado juízo que
discerne as causas próximas e remotas do devir histórico. Porém, é mais frequente,
o que nos tenta a concluir que é natural, que se escreva a história a favor ou
contra certas concepções, partidos ou ideologias. Os que escrevem a história
antiportuguesa pretendem reduzir a intervenção do nosso povo no curso geral das
coisas a um empreendimento terrorista, enfatizando este e aquele acto de
violência, induzindo apressadamente a partir de certa infâmia, recortando do
volumoso e riquíssimo manancial de quase seis séculos de actuação ultramarina
dos Portugueses somente o trânsito negreiro no Atlântico, procurando
apresentá-lo como a herança definitiva legada à posteridade humana da Expansão
e do Império.
A história antiportuguesa redige-se,
algumas vezes, com recurso à pura e simples mentira. Na grande maioria destes
casos, o leitor ou o ouvinte consciencioso poderá desalojar um livro de
historiografia séria da sua estante, ou da prateleira de qualquer biblioteca
pública nas proximidades, e prevenir-se contra a fraude. Porém, a história
antiportuguesa é quase sempre produzida por métodos mais subtis. Em breve, mas
significativo ensaio, «Catholic Truth in History», Hilaire Belloc descreveu os
modos pelos quais na Inglaterra protestante se forjavam tratados e manuais
anticatólicos. Os métodos da historiografia anticatólica que Belloc examina são
aplicáveis a qualquer pessoa ou colectividade cuja história, e identidade, se
queira deformar para qualquer propósito, e também se encontram na
historiografia antiportuguesa, o que qualquer escrutinador será capaz de fazer,
uma vez apercebida a natureza de tais procedimentos.
A história antiportuguesa começa a
gerar-se na selecção dos materiais. Qualquer narrativa impõe uma selecção dos
factos a mencionar. As crónicas dos feitos humanos oferecem-nos um oceano de
sucessos, personalidades e contextos, entre o qual é necessário peneirar o que
se julga dever ficar registado. Assim, a selecção do material pode fazer-se de
modo a que a verdade seja obnubilada, ainda que cada facto que se apresente
seja verdadeiro. A história antiportuguesa selecciona somente entre os anais da
Expansão e do Império aquilo que oferece um retrato escabroso do nosso
empreendimento colectivo.
O tom do narrador é sempre elemento
não desprezível de qualquer obra de historiografia. O tom antiportuguês
empregará a ironia para com os nossos maiores feitos, usará das palavras mais
fortes e emocionais para descrever os abusos verificados, introduzirá
expressões de insinuadora ambiguidade em parágrafos onde competiria imperar o
rigor descritivo.
Por fim, a proporção escolhida entre
as diversas partes da narrativa concorre para completar um retrato mentiroso na
historiografia antiportuguesa. Dois historiadores podem seleccionar o mesmo
conjunto de factos a tratar nas suas obras. Mas a dimensão e a ênfase que
conferem a cada um dos factos, a ordem em que estes são postos na narrativa,
impressionam de forma diversa, mais favorável ou prejudicial, o leitor. O que
história contra Portugal não hesitará em desamarrar a pensa, que navega à
bolina do seu ódio, para relatar, com pormenores grotescos, o que de infame
existir para ser publicado sobre o nosso passado imperial.
A história da expansão ultramarina
de Portugal, como um todo, e nas suas partes, tem sido objecto destes múltiplos
métodos de ocultar e deformar a verdade histórica. Mais recentemente,
aproveitando o ímpeto projectado desde o estrangeiro, a historiografia
antiportuguesa tem-se empenhado em reduzir a história da Expansão e do Império
ao tráfico negreiro, aos abusos praticados sobre os nativos americanos e
africanos, às razias e à guerra. Ainda que quaisquer alegações relacionadas com
estes eventos, em si mesmas, sejam verdadeiras, e em muitos casos não o são, a
exposição que com eles se constrói da história de Portugal é falsa. Excluídos
ficam os decisivos contributos de Portugal para o progresso da Humanidade: a
vitória sobre a distância, a fundação de um verdadeiro mercado mundial, a
difusão de tecnologia, a revolução alimentar... Em sumário, o pioneirismo na
globalização, a tomada da posse da Terra pela Humanidade, dos quais todos,
hoje, em maior ou menor grau, gozamos os frutos, desconhecidos dos antigos
durante milénios.
No próximo texto de história antiportuguesa que
encontrar, o estimado leitor poderá, olhando à selecção, ao tom, à proporção
usadas, apontar exactamente onde é que está a mentira.