O Diabo, 21 de Outubro de 2014
« S A N E A M E N T O S » D E E S Q U E R D A
J Á C H E G A R A M A O V A T I C A
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Na sequência do Sínodo da Família, foram já caladas várias vozes discordantes da «modernização»
O Papa Francisco, que se sentou na cadeira de São Pedro com um sorriso angélico de conciliador, começa a dar sinais de estar refém dos «lobbies» radicais da Igreja. A nova moda no Vaticano, agora, é «sanear» quem não concorda com a «modernização», o divórcio e os «casais gay». O PREC instalou-se na Cúria Romana.
Foi uma das frases emblemáticas do cardeal argentino Jorge Bergoglio ao ser entronizado como Sumo Pontífice, em Março do ano passado: o novo Papa pretendia ser «uma ponte entre margens do mesmo rio». Queria conciliar as várias tendências na Igreja Católica, a todas respeitando. Aspirava a um Pontificado de evolução harmoniosa e justa.
Dezanove meses depois, o mesmo Bergoglio mostra uma face infinitamente menos «dialogante». Na sequência do Sínodo da Família, que terminou no último sábado em Roma, foram já caladas várias vozes discordantes da «modernização» apressada defendida pelos «lobbies» esquerdistas. E o Cardeal conservador Raymond Burke acaba de engrossar a lista dos «saneados» ao ser despedido da presidência do Supremo Tribunal Canónico por não pensar como os «progressistas».
A terceira assembleia-geral extraordinária do Sínodo dos Bispos, convocada para debater o tema «Os desafios pastorais da Família no contexto da evangelização», marca uma viragem na política da Santa Sé e uma tentativa de alteração substancial da doutrina da Igreja sobre temas tão controversos como a homossexualidade, o divórcio e o aborto.
Confirmam-se as piores suspeitas: os «sinais de mudança» dados pelo Papa Francisco ao iniciar o seu Pontificado abriram as portas laterais da Santa Sé a elementos radicais defensores da chamada «Teologia da libertação» e a outros grupos de «católicos progressistas» com uma indisfarçável agenda política. No Vaticano, há um Processo Revolucionário em Curso – um PREC que ameaça sacudir os pilares do pensamento cristão e da doutrina católica.
PAGAR CARA A OUSADIA
O caso do Cardeal norte-americano Raymond Burke é paradigmático. Logo que, no início da semana passada, foi conhecida a proposta de relatório preliminar do Sínodo da Família, os sectores mais tradicionais denunciaram a tentativa de radicalização do discurso oficial da Igreja. O Cardeal Burke foi um deles, mas não se ficou pelo protesto: sugeriu uma nova redacção.
Em alternativa a um capítulo em que se afirmava que a homossexualidade tinha «dons e qualidades a oferecer à comunidade cristã», o prelado propôs uma abordagem que enaltecesse a vida humana (e não o aborto), o casamento (e não o divórcio) e a Família (e não as «uniões de facto» entre pessoas do mesmo sexo). Dirigindo-se expressamente a Francisco, o Cardeal recordou que o Papa «não é livre de alterar os ensinamentos da Igreja em relação à imoralidade dos actos homossexuais ou à indissolubilidade do casamento».
Burke pagou cara a ousadia: ainda o Sínodo não tinha terminado e já o Cardeal norte-americano era destituído do cargo de presidente do Supremo Tribunal Canónico do Vaticano. Nos últimos dias, na Santa Sé, corria o rumor de que Burke deverá agora ser nomeado para presidir à Ordem de Malta – um cargo apenas honorífico que o manterá convenientemente afastado das decisões vaticanas.
Raymond Burke não é o único «saneado» por defender opiniões conservadoras. Outros prelados tidos como próximos do anterior Pontífice, Bento XVI, foram já destituídos de cargos de relevo na Cúria Romana: o Cardeal Mauro Piacenza, o Arcebispo Guido Pozzo e o Bispo Giuseppe Sciacca são alguns dos mais destacados. E uma espada de Dâmocles pende sobre a cabeça do Cardeal Gerhard Müller, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, cujo «pecado» é ser um defensor da doutrina tradicional da Igreja.
Em Portugal, o frade dominicano Bento Domingues, conhecido pelo seu radicalismo esquerdista, veio já defender a política papal de «neutralizar as forças que se opõem à mudança». Les beaux esprits se rencontrent…
No último sábado, num assomo de bom senso cada vez mais raro na Santa Sé, o Sínodo dos Bispos acabou por eliminar do relatório final as referências mais polémicas: os radicais não conseguiram ainda conquistar para a sua causa a maioria de dois terços dos votos entre os cerca de 200 prelados participantes.
Mas a recomendação de «compreensão» face ao «fenómeno do divórcio» obteve quase 60 por cento dos sufrágios; e a proposta de «abertura aos gays», ainda que expurgada de um insólito parágrafo de «boas vindas», prevaleceu como princípio caritativo com 65 por cento dos votos.
O Sínodo voltará a debater o tema em 2015.
CHEIRO A ESTURRO
O Sínodo da Família teve uma longa preparação de um ano. No Outono de 2013, o Papa fez distribuir por toda a Igreja um inquérito de 39 perguntas-base tendo em vista a «escolha dos temas» a debater no encontro dos bispos. Preparado pelos serviços do Sínodo, o inquérito foi enviado às Conferências Episcopais de todo o mundo para que o «adaptassem às realidades nacionais». A versão portuguesa acabou por ter um total de 58 perguntas.
Já então nos meios católicos moderados e conservadores cresciam desconfianças sobre as movimentações entusiásticas dos partidos esquerdistas da Europa em torno desta sondagem. O DIABO alertava: «No próprio Vaticano, os «lobbies» radicais da Igreja vão preparando a opinião pública católica para uma «viragem à esquerda» em matérias tão melindrosas como a homossexualidade, as «uniões de facto» e o aborto. O inquérito mundial sobre a Família é mais um passo nesse sentido».
Tornara-se já óbvio, há um ano, que o Sumo Pontífice romano, devido à sua atitude «aberta» e «descontraída», se colocara numa posição vulnerável face às pressões dos «lobbies» esquerdistas, que desde a sua eleição começaram a ocupar lugares-chave nas comissões pontificias.
Na aparência, a sondagem papal era «bem intencionada», ao pretender caracterizar a atitude dos católicos sobre temas relacionados com a Família. No entanto, o conteúdo de algumas perguntas logo suscitou as maiores inquietações, ao tratar casualmente e com estranho à-vontade problemas de grande complexidade e melindre como o «casamento» entre pessoas do mesmo sexo, o uso de contraceptivos artificiais, o acasalamento pré-matrimonial e até o aborto, pedindo opiniões sobre qual a «atenção pastoral» que deveria ser dada a tais casos.
Entre outras peculiaridades, o inquérito admitia que, a uma das perguntas, o fiel católico respondesse «não concordo com o ensinamento da Igreja» ou «tem coisas boas, mas não é para mim». O inquérito indagava sobre se «a coabitação pré-matrimonial é uma realidade pastoral relevante na sua paróquia». Perguntava «que atenção pastoral é possível prestar às pessoas do mesmo sexo que têm crianças ao seu cargo». E pretendia apurar se «o recurso a métodos abortivos é reflectido no sacramento da penitência» (isto é, se as mulheres que abortam referem o facto na confissão). Num Sínodo sobre a vivência cristã da Família, estas perguntas não podiam deixar de cheirar a esturro…
TEÓLOGA LÉSBICA E FREIRA APAIXONADA
Segundo o sociólogo da religião argentino Bernardo Barranco, então citado pel’O DIABO, a eleição de Francisco para a cadeira de S. Pedro correspondera à necessidade de a Igreja enfrentar «uma crise de época» com uma nova imagem, mas «a oportunidade foi imediatamente aproveitada para infiltrar no Vaticano elementos esquerdistas».
Na mesma semana em que o inquérito foi distribuído mundialmente, a teóloga Judith Vásquez, conhecida «lobbista» latino-americana que se assume como «lésbica e feminista», ganhou relevo na imprensa internacional ao defender que o Sínodo deveria adaptar a posição da Igreja «às necessidads da sociedade». E o frade Julián Cruzalta, professor «progressista» de Teologia e «assessor teológico» da organização internacional «Católicas pelo Direito a Decidir», defendia que a Igreja «tem de mudar», sob pena de ficar «isolada do mundo». Uma «cassette» bem conhecida.
A divulgação do inquérito preparatório do Sínodo fez saltar das suas tocas os principais agentes radicais da Igreja. A freira catalã Teresa Forcades, que se apresenta como «feminista» e «anti-capitalista», afirmou (a propósito do inquérito) que «é bom que as pessoas se agitem, para que haja mudanças. Temos uma Igreja que, na sua estrutura, é patriarcal e misógina». Monja beneditina do Convento de Monserrate, em Barcelona, Teresa Forcades, médica de formação, tornou-se rapidamente «a freira da moda» entre os radicais depois de ter defendido «a revolução e a ruptura» na Igreja Católica. A BBC de Londres chamou-lhe «a freira mais radical da Europa».
Curiosamente, a «freira da moda» esteve em Portugal na mesma semana em que a Conferência Episcopal dava início à difusão do inquérito, para participar num colóquio sobre «teologias feministas», aproveitando para defender o «casamento gay» e a adopção de crianças por «casais» homossexuais. Quanto ao aborto, «não rejeita». A desconcertante freira defendeu ainda «a incompatibilidade entre capitalismo e democracia» e confessou a um jornalista que já se apaixonara duas vezes desde a sua entrada no Convento...