terça-feira, 5 de janeiro de 2016


O candidato Henrique Neto conhecia fraudes


Notícias Lusófonas

Henrique Neto, administrador da Iberomoldes que chegou a ser constituído arguido na Operação Furacão, mas não foi acusado, porque pagou o que devia ao fisco, confessou no depoimento que consta do processo ter «consciência» de que estavam a ser criadas ou usadas empresas «para aumentar os custos» da Iber Oleff – sociedade que foi visada na investigação e da qual era sócio – e de que havia «distribuição de ‘dinheiros’ a alguns sócios que não chegavam a ser declarados».


A Iber Oleff – Componentes Técnicos em Plástico, nascida de uma parceria entre o grupo alemão Olho Tecknik e o grupo Iberomoldes, foi uma das empresas que recorreram aos serviços do grupo Finatlantic, que visava obter vantagens fiscais atractivas para os seus clientes. O esquema que levou, em Junho, à acusação de 30 pessoas num processo nascido da Operação Furacão, terá lesado o Estado em mais de 36 milhões de euros (36 639 21 euros) e passava por ocultar os rendimentos através da transferência de dinheiro para entidades sedeadas em paraísos fiscais e no Reino Unido.

A casa e empresa de Henrique Neto foram alvo de buscas no final de 2007. Nessa altura, o ex-deputado socialista adiantou à imprensa não ter razões «para suspeitar» que estariam «em falta». Admitia, contudo, poderem existir «questões pontuais na relação do grupo com o Estado». Dois meses depois, a 13 de Fevereiro de 2008, admitiu aos procuradores Rosário Teixeira e Ana Catalão ter «tomado conhecimento da intenção da sociedade Iber Oleff de aderir a um esquema que visasse a diminuição de resultados ou lucros». Mas acrescentou não saber pormenores sobre como iria funcionar.

Nesse depoimento, o empresário viria também a confessar «ter recebido alguns montantes monetários, tendo-os utilizado, pelo menos em parte, em benefício próprio». Nesse mesmo dia, o administrador da Iberomoldes remeteu às finanças os rendimentos não declarados e pagou o imposto num total superior a 30 mil euros: 22 621,94 euros, relativos ao ano de 2002, e 8 174 euros, relativos a 2005. Um dia depois, foi a vez de a Iber Oleff pagar o que devia às Finanças: 433 487 euros. Por terem pago, apesar da resistência do juiz Carlos Alexandre, quer o empresário, quer a empresa, viriam a beneficiar da suspensão provisória do processo, livrando-se de uma acusação por fraude fiscal qualificada.

No final de 2002, a sociedade Iber Oleff entrou em contacto com a Finatlantic, com vista à criação e/ou utilização de uma sociedade suíça, uma no Delaware, EUA, uma no Reino Unido e outra sedeada no Belize. De acordo com os autos do processo que o i consultou, parte dos montantes que circularam entre as sociedades offshore entre 2002 e 2005 foram transferidos para as contas da sociedade DTA (Belize) e SITAR (Delaware), abertas no Banco Fiduciário Internacional (BFI) até serem finalmente divididos pelos três administradores, consoante a participação que tinham na Iber Oleff: Henrique Neto viria a receber 85 mil euros em 2003 e 17 083 euros em 2005. Interrogado pelos procuradores do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), disse nunca ter ouvido falar do BFI, nem da Finatlantantic, nem do cabecilha da empresa, Diogo Viana.






Juramento d’El-Rei D. Affonso Anriques



Conservado no Archivo do Real Mosteiro de Alcobaça

Eu Affonso Rei de Portugal, filho do Conde Henrique, e neto do grande Rei D. Affonso, diante de vós Bispo de Braga, e Bispo de Coimbra, e Theotonio, e de todos os mais Vassallos de meu Reino, juro em esta Cruz de metal, e neste livro dos Santos Evangelhos, em que ponho minhas mãos, que eu miseravel peccador vi com estes olhos indignos a nosso Senhor JESU Christo estendido na Cruz, no modo seguinte.

Eu estava com meu exercito nas terras de Alentejo, no Campo de Ourique, para dar batalha a Ismael, e outros quatro Reis Mouros, que tinham consigo infinitos milhares de homens, e minha gente temerosa de sua multidão, estava atribulada, e triste sobremaneira, em tanto que publicamente diziam alguns ser temeridade acommetter tal jornada. E eu enfadado do que ouvia, comecei a cuidar comigo, que faria; e como tivesse na minha tenda um livro em que estava escripto o Testamento Velho, e o de Jesu Christo, abri-o, e li nelle a vitoria de Gedeão, e disse entre mim mesmo. Mui bem sabeis vós, Senhor JESU Christo, que por amor vosso tomei sobre mim esta guerra contra vossos adversarios, em vossa mão está dar a mim, e aos meus fortaleza para vencer estes blasfemadores de vosso nome.

Ditas estas palavras adormeci sobre o livro, e comecei a sonhar, que via um homem velho vir para onde eu estava, e que me dizia: Affonso, tem confiança, porque vencerás, e destruirás estes Reis infieis, e desfarás sua potencia, e o Senhor se te mostrará.

Estando nesta visão, chegou João Fernandes de Sousa meu Camareiro
dizendo-me: 

Acordai, senhor meu, porque está aqui um homem velho, que vos quer fallar. Entre (lhe respondi) se é Catholico: e tanto que entrou, conheci ser aquelle, que no sonho vira; o qual me disse:

Senhor tende bom coração, vencereis, e não sereis vencido; sois amado do Senhor, porque sem duvida poz sobre vós, e sobre vossa geração depois de vossos dias os olhos de sua misericordia, até a decima sexta decendencia, na qual se diminuiria a successão, mas nella assim diminuida elle tornará a pôr os olhos e verá.

Elle me manda dizer-vos, que quando na seguinte noite ouvirdes a campainha de minha Ermida, na qual vivo ha sessenta e seis annos, guardado no meio dos infieis, com o favor do mui Alto, saias fóra do Real sem nenhuns creados, porque vos quer mostrar sua grande piedade.

Obedeci, e prostrado em terra com muita reverencia, venerei o Embaixador, e quem o mandava; e como posto em oração aguardasse o som, na segunda vela da noite ouvi a campainha, e armado com espada e rodela sahi fóra dos Reais, e subitamente vi a parte direita contra o Nacente, um raio resplandecente; e indo-se pouco, e pouco clarificando, cada hora se fazia maior; e pondo de proposito os olhos para aquella parte, vi de repente no proprio raio o sinal da Cruz, mais resplandecente que o Sol, e Jesu Christo Crucificado nella, e de uma e de outra parte, uma copia grande de mancebos resplandecentes, os quaes creio, que seriam os Santos Anjos. Vendo pois esta visão, pondo á parte o Escudo, e espada, e lançando em terra as roupas, e calçado me lancei de bruços, e desfeito em lagrimas comecei a rogar pela consolação de meus vassallos, e disse sem nenhum temor.

A que fim me apareceis Senhor? Quereis por ventura accrescentar fé a quem tem tanta? Melhor é por certo que vos vejam os inimigos, e cream em vós, que eu, que desde a fonte do Baptismo vos conheci por Deos verdadeiro, Filho da Virgem, e do Padre Eterno, e assim vos conheço agora. A Cruz era de maravilhosa grandeza, levantada da terra quasi dez covados.

O Senhor com um tom de voz suave, que minhas orelhas indignas ouviram, me disse.

Não te apareci deste modo para accrescentar tua fé, mas para fortalecer teu coração neste conflito, e fundar os principios de teu Reino sobre pedra firme. Confia Affonso, porque não só vencerás esta batalha, mas todas as outras em que pelejares contra os inimigos de minha Cruz. Acharás tua gente alegre, e esforçada para a peleja, e te pedirá que entres na batalha com titulo de Rei. Não ponhas duvida, mas tudo quanto te pedirem lhe concede facilmente. Eu sou o fundador, e destruidor dos Reinos, e Imperios, e quero em ti, e teus decendentes fundar para mim um Imperio, por cujo meio seja meu nome publicado entre as Nações mais estranhas. E para que teus decendentes conheçam quem lhe dá o Reino, comporás o Escudo de tuas Armas do preço com que eu remi o genero humano, e daquelle porque fui comprado dos judeos, e ser-me-ha Reino santificado, puro na fé, e amado por minha piedade.

Eu tanto que ouvi estas cousas, prostrado em terra o adorei dizendo:

Porque meritos, Senhor, me mostrais tão grande misericordia? Ponde pois vossos benignos olhos nos successores que me prometeis, e guardai salva a gente Portugueza. E se acontecer, que tenhais contra ella algum castigo apparelhado, executai-o antes em mim, e em meus descendentes, e livrai este povo, que amo como a único filho.

Consentindo nisto o Senhor, disse:

Não se apartará delles, nem de ti nunca minha misericordia, porque por sua via tenho apparelhadas grandes searas, e a elles escolhidos por meus segadores em terras mui remotas.

Ditas estas palavras dezapareceu, e eu cheio de confiança, e suavidade me tornei para o Real. E que isto passasse na verdade, juro eu D. Affonso pelos Santos Evangelhos de JESU Christo tocados com estas mãos. E por tanto mando a meus decendentes, que para sempre succederem, que em honra da Cruz e cinco Chagas de JESU Christo tragam em seu Escudo cinco Escudos partidos em Cruz, e em cada um delles os trinta dinheiros, e por timbre a Serpente de Moysés, por ser figura de Christo, e este seja o tropheo de nossa geração. E se alguem intentar o contrario, seja maldito do Senhor, e atormentado no Inferno com Judas o treidor.

Foi feita a presenta carta em Coimbra aos vinte e nove de Outubro, era de mil e cento e cincoenta e dous.


Eu El-Rei D. Affonso.


João Metropolitano Bracharense. - João Bispo de Coimbra.- Theotonio Prior. - Fernão Peres Vedor da Casa.- Vasco Sanches.- Affonso Mendes Governador de Lisboa.- Gonçalo de Sousa Procurador de entre Douro e Minho.- Payo Mendes Procurador de Viseu.- Sueiro Martins Procurador de Coimbra.- Mem Peres o escreveu por Mestre Alberto Cancellario del-Rei.






Conferência


A Associação Cristóvão Colon apresenta a Conferência

«Colon, dito Colombo – foi um Português que descobriu a América?»

Organizado pela Junta de Freguesia de Alvalade (Rua Conde de Arnoso, 5-B, Lisboa) no dia 11 de Janeiro às 10h30, e que terá lugar no respectivo auditório.






segunda-feira, 4 de janeiro de 2016


O CDS depois de Portas


André Azevedo Alves, Observador, 2 de Janeiro de 2016

Não comungando das concepções liberais do autor, não deixamos de achar interessante para documentação este texto sobre Paulo Portas, que reproduzimos.

Mais do que saber quem será o próximo líder, importa que o CDS discuta ideias e políticas e reflicta sobre a sua razão de ser no sistema político-partidário português.

Alguns dias antes do anúncio público de Paulo Portas de que vai abandonar a liderança do CDS, numa conversa informal com um amigo, foi-me perguntado por que utilizo ocasionalmente um tom algo agreste quando escrevo sobre Portas. Respondi que não tenho qualquer animosidade pessoal contra Paulo Portas e que lhe reconheço até várias importantes qualidades para a acção política, mas que ao mesmo tempo o seu tacticismo extremo e a sua excessiva flexibilidade no plano das ideias e dos princípios me desagradam profundamente.

O meu interlocutor nessa conversa – conhecedor profundo da realidade política portuguesa – chamou-me a atenção para o facto de esses defeitos estarem longe de serem exclusivos de Portas, existindo também em muitos outros actores políticos que, adicionalmente, não partilham os seus méritos. Esta pertinente constatação levou-me a examinar de forma mais profunda a avaliação que faço do trajecto e da figura política de Paulo Portas. Uma reflexão que se torna mais oportuna depois do anúncio de que não se recandidatará à liderança do partido que nos últimos 15 anos moldou progressivamente à sua imagem.

Após realizar esse exame, creio que a resposta reside em parte no projecto que trouxe Portas para a ribalta: o semanário «O Independente». Como muitos outros da minha geração, fui um aficionado e, durante bastante tempo, fiel seguidor do jornal. Retrospectivamente, não hesito em concordar com o Henrique Raposo que «O Independente» foi essencialmente um projecto estético, sem um conjunto claro e coerente de ideais morais e políticas orientadoras e mais pós-moderno do que conservador.

Mais: hoje é para mim claro que todo o projecto (incluindo os seus aficionados, grupo de que fiz parte) padecia de um provincianismo e de um deslumbramento com algumas referências externas que o diminuíam. A soberba conduziu com demasiada frequência à boçalidade e a comportamentos mesquinhos e até vingativos. Mas, mesmo reconhecendo tudo isto, «O Independente» não deixou de ter um impacto revolucionário na política portuguesa da época e de ser profundamente marcante. E Paulo Portas foi indiscutivelmente a sua figura de proa.

Ora, creio que é em larga medida por esse trajecto anterior que a conduta política de Portas ao longo dos anos se torna mais criticável. Ao defender ideias que muito justamente criticou e condenou no passado e ao praticar ele próprio grande parte dos vícios que denunciou, Paulo Portas carrega na sua encarnação como político um odioso maior do que a generalidade dos membros da classe política portuguesa. Era-lhe exigível mais e Portas não conseguiu estar à altura do padrão que lhe era exigível.

A situação em que Paulo Portas deixa o seu partido foi muito bem sintetizada por Rui Albuquerque, um conhecedor simultaneamente profundo e distanciado da realidade do CDS:

« (…) Paulo Portas não deixa um projecto político, nem foi capaz de o criar. O CDS é «o partido do Paulo» e, apesar do brilhantismo do «Paulo» ou, se calhar, por causa dele, o CDS não tem alma própria, nem existência real, o que é bem visível na quase inexistência autárquica do partido. Se alguém estiver interessado em encontrar no CDS, não digo um programa político ou uma ideologia, duas ou três ideias avulsas que o caracterizem politicamente, não será fácil achá-las. (…) O problema da demissão de Paulo Portas não está, assim, em encontrar-lhe um sucessor. Nomes e candidatos não faltarão. Mas no facto do carisma de Portas não se transmitir «mortis causa» e do CDS não ter mais nada para legar.»

Ironicamente, neste contexto, a vontade de poder de António Costa e a «geringonça» governamental que articulou em precária articulação com bloquistas e comunistas acabou por dar um valioso contributo para a continuação do CDS enquanto partido autónomo. Depois de praticamente dizimada a base autárquica do CDS, sem princípios que o distingam no panorama partidário português e com uma organização e imagem totalmente centradas na figura do seu líder, dificilmente o CDS resistiria a mais quatro anos de coligação governamental com o PSD.

Chegados a este ponto, importa olhar para o futuro do partido. A escolha caberá – como não poderia deixar de ser – aos militantes do CDS mas parece claro que o grande desafio que se coloca é fazer o que Portas não fez (e já não teria condições para fazer, depois do slogan vazio do «partido do contribuinte» e do inenarrável guião para a reforma do Estado que apresentou): afirmar o CDS como um partido com uma plataforma e discurso consistentes, distintivos e que marquem um espaço próprio à direita. Um espaço que não deve ser delimitado de forma exclusivista e pode provavelmente incluir tendências conservadoras, liberais e democratas-cristãs.

Mais do que saber quem será o próximo líder, importa que o CDS discuta ideias e políticas e reflicta sobre a sua razão de ser no sistema político-partidário português. O primeiro passo para o conseguir é ultrapassar rapidamente a dicotomia entre seguidores e opositores de Paulo Portas. O segundo passo será que o próximo líder não tente imitar Portas que, para o bem e para o mal, será inimitável. Quanto ao próprio Paulo Portas, com todos os seus talentos e defeitos – e, recorde-se, com apenas 53 anos – vai certamente continuar a andar por aí.