José António Saraiva, Jornal Sol, 26 de Janeiro de 2015
Depois dos atentados em Paris, o primeiro-ministro
francês, Manuel Valls, e a chanceler alemã, Angela Merkel, fizeram uma declaração
solene: «A luta é contra o terrorismo, não é contra o Islão».
O pior inimigo dos muçulmanos que hoje vivem na
Europa é a inacção dos Governos nacionais – permitindo uma liberdade de acção
aos fundamentalistas que acaba por virar a opinião pública contra toda a
comunidade islâmica
A intenção era óbvia: tentar precaver acções
racistas contra os muçulmanos – e, ao mesmo tempo, acalmar os países islâmicos
amigos.
Mas dizer isto é tentar tapar o sol com a peneira.
Porque este tipo de terrorismo é indissociável do
Islão.
Os terrorismos não são todos iguais – e o
terrorismo islâmico tem características próprias, sendo completamente diferente
dos terrorismos que conhecemos na Europa.
As organizações terroristas europeias das últimas
décadas – o Baader-Meinhof na Alemanha, as Brigadas Vermelhas em Itália, o Sinn
Fein na Irlanda, a ETA no País Basco, as FP-25 em Portugal – actuavam
geograficamente e tinham objectivos políticos concretos.
O terrorismo islâmico, pelo contrário, não é
localizado geograficamente – está disseminado por todo o planeta – e não tem um
objectivo político determinado – visa atingir a civilização Ocidental no seu
conjunto.
Há quem, como Ana Gomes, tente explicar o
terrorismo islâmico com base nas más condições de vida ou numa deficiente
integração dos muçulmanos nos países de imigração.
Ora, dizer isto é não compreender o fenómeno.
Se as condições de vida produzissem terroristas, já
teríamos visto muitos pobres em Portugal, atingidos pela austeridade, pegarem
em metralhadoras e irem por aí fora a matar pessoas.
E se fosse pela deficiente integração, muitos
africanos em Portugal já se teriam transformado em homens-bomba.
As condições de vida e o desenraizamento podem
facilitar o recrutamento de operacionais, mas a raiz do terrorismo islâmico é outra.
E se fosse esta também não teria solução, pois a
Europa não vai sair da crise tão cedo e a integração dos muçulmanos nas
sociedades europeias nunca será completa...
Como se vê em França, na Bélgica, em Inglaterra ou
na Alemanha, as populações de origem árabe, por exemplo, conservam em geral os
seus hábitos de vida: comem a sua comida, vestem à sua maneira, professam a sua
religião, lêem os seus jornais, vivem nos seus bairros.
E depois, em virtude de serem cada vez mais
associados ao terrorismo, os muçulmanos são olhados com desconfiança pelo resto
da população – o que agrava a segregação.
Perante um muçulmano, as pessoas hoje pensam: quem
sabe se por detrás deste homem não se esconde um terrorista?
Ao contrário de outros terrorismos, o terrorismo
islâmico é de natureza religiosa – embora haja dificuldade em aceitar esta
ideia, porque a cartilha marxista, que continua a condicionar o pensamento de
muita gente, contempla sobretudo as condições socio-económicas.
Mas basta olhar para a História para o perceber: a
guerra entre o Islão e o Ocidente cristão vem de muito longe (e nós sabemos
isso melhor do que ninguém, pois ajudámos a expulsar os «infiéis» da
Península).
Sucede que, ao contrário do cristianismo, o
islamismo conservou uma vertente fundamentalista e violenta, bem expressa nas
atrocidades de Khomeyni, de Bin Laden ou do Estado Islâmico.
E o fundamentalismo não tem parado de crescer nos
últimos tempos – conquistando cada vez mais terreno no Norte de África e
multiplicando os atentados terroristas pelo mundo fora.
Neste momento, a Europa é um paraíso para os
terroristas islâmicos, pela ausência de fronteiras nacionais, pela liberdade de
movimentos, pela liberdade de propaganda, etc.
Em nenhuma parte do mundo existem tais condições.
Ora isto pode fazer do continente europeu, nos
tempos que aí vêm, um palco privilegiado para os ataques terroristas.
Até porque aqui vivem 50 milhões de muçulmanos,
possibilitando que eles se escondam com tremenda facilidade (procurar um
muçulmano em certos países da Europa é como procurar agulha em palheiro) e
oferecendo um campo de recrutamento muito grande.
Enfrentar o terrorismo islâmico na Europa é uma
tarefa ciclópica.
Mas há uma coisa a fazer antes de mais nada:
abandonar os preconceitos ideológicos, os complexos de esquerda e os clichés –
e aceitar pôr tudo em questão.
A recusa dos partidos do sistema em debater
descomplexadamente a imigração, está a entregar à extrema-direita o monopólio
do debate sobre este tema.
Ora, isso é perigosíssimo.
Os partidos centrais têm de ser mais activos e
firmes no combate a este flagelo.
Não podem revelar a passividade e a inocência que
têm demonstrado.
Como aceitar, por exemplo, que alguns imãs
continuem a pregar livremente a violência e a recrutar homens nas
mesquitas de Paris ou Bruxelas para ataques terroristas?
Como admitir que em Londres haja municípios ostentando
à entrada placas dizendo: «Está a entrar numa zona controlada pela sharia [lei
islâmica]»?
É inadmissível.
Muitos europeus começam a estar cansados, com medo,
aterrorizados mesmo – e, se os Governos não derem respostas concretas, o
racismo anti-muçulmano na Europa pode ficar fora de controlo.
E os partidos da extrema-direita continuarão a
crescer eleitoralmente e começarão a ganhar eleições.
O tempo urge.
O discurso politicamente correcto já deu o que
tinha a dar e não convence ninguém.
Os próprios muçulmanos estão fartos dele, pois a
sua vontade é que se comece a separar o trigo do joio, não pagando o justo pelo
pecador.
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