quarta-feira, 9 de agosto de 2017

Métodos da história antiportuguesa


Escola de Sagres: organizada por D. Henrique, desenvolveu técnicas de navegação
e a indústria marítima, porém a historiografia ignora a sua existência.

Hugo Dantas, Nova Portugalidade, 6 de Agosto de 2017

A História querer-se-ia a investigação rigorosa da acção colectiva da Humanidade, ou das muitas humanidades que a compõem, completada com o prudente e desapaixonado juízo que discerne as causas próximas e remotas do devir histórico. Porém, é mais frequente, o que nos tenta a concluir que é natural, que se escreva a história a favor ou contra certas concepções, partidos ou ideologias. Os que escrevem a história antiportuguesa pretendem reduzir a intervenção do nosso povo no curso geral das coisas a um empreendimento terrorista, enfatizando este e aquele acto de violência, induzindo apressadamente a partir de certa infâmia, recortando do volumoso e riquíssimo manancial de quase seis séculos de actuação ultramarina dos Portugueses somente o trânsito negreiro no Atlântico, procurando apresentá-lo como a herança definitiva legada à posteridade humana da Expansão e do Império.

A história antiportuguesa redige-se, algumas vezes, com recurso à pura e simples mentira. Na grande maioria destes casos, o leitor ou o ouvinte consciencioso poderá desalojar um livro de historiografia séria da sua estante, ou da prateleira de qualquer biblioteca pública nas proximidades, e prevenir-se contra a fraude. Porém, a história antiportuguesa é quase sempre produzida por métodos mais subtis. Em breve, mas significativo ensaio, «Catholic Truth in History», Hilaire Belloc descreveu os modos pelos quais na Inglaterra protestante se forjavam tratados e manuais anticatólicos. Os métodos da historiografia anticatólica que Belloc examina são aplicáveis a qualquer pessoa ou colectividade cuja história, e identidade, se queira deformar para qualquer propósito, e também se encontram na historiografia antiportuguesa, o que qualquer escrutinador será capaz de fazer, uma vez apercebida a natureza de tais procedimentos.

A história antiportuguesa começa a gerar-se na selecção dos materiais. Qualquer narrativa impõe uma selecção dos factos a mencionar. As crónicas dos feitos humanos oferecem-nos um oceano de sucessos, personalidades e contextos, entre o qual é necessário peneirar o que se julga dever ficar registado. Assim, a selecção do material pode fazer-se de modo a que a verdade seja obnubilada, ainda que cada facto que se apresente seja verdadeiro. A história antiportuguesa selecciona somente entre os anais da Expansão e do Império aquilo que oferece um retrato escabroso do nosso empreendimento colectivo.

O tom do narrador é sempre elemento não desprezível de qualquer obra de historiografia. O tom antiportuguês empregará a ironia para com os nossos maiores feitos, usará das palavras mais fortes e emocionais para descrever os abusos verificados, introduzirá expressões de insinuadora ambiguidade em parágrafos onde competiria imperar o rigor descritivo.

Por fim, a proporção escolhida entre as diversas partes da narrativa concorre para completar um retrato mentiroso na historiografia antiportuguesa. Dois historiadores podem seleccionar o mesmo conjunto de factos a tratar nas suas obras. Mas a dimensão e a ênfase que conferem a cada um dos factos, a ordem em que estes são postos na narrativa, impressionam de forma diversa, mais favorável ou prejudicial, o leitor. O que história contra Portugal não hesitará em desamarrar a pensa, que navega à bolina do seu ódio, para relatar, com pormenores grotescos, o que de infame existir para ser publicado sobre o nosso passado imperial.

A história da expansão ultramarina de Portugal, como um todo, e nas suas partes, tem sido objecto destes múltiplos métodos de ocultar e deformar a verdade histórica. Mais recentemente, aproveitando o ímpeto projectado desde o estrangeiro, a historiografia antiportuguesa tem-se empenhado em reduzir a história da Expansão e do Império ao tráfico negreiro, aos abusos praticados sobre os nativos americanos e africanos, às razias e à guerra. Ainda que quaisquer alegações relacionadas com estes eventos, em si mesmas, sejam verdadeiras, e em muitos casos não o são, a exposição que com eles se constrói da história de Portugal é falsa. Excluídos ficam os decisivos contributos de Portugal para o progresso da Humanidade: a vitória sobre a distância, a fundação de um verdadeiro mercado mundial, a difusão de tecnologia, a revolução alimentar... Em sumário, o pioneirismo na globalização, a tomada da posse da Terra pela Humanidade, dos quais todos, hoje, em maior ou menor grau, gozamos os frutos, desconhecidos dos antigos durante milénios.

No próximo texto de história antiportuguesa que encontrar, o estimado leitor poderá, olhando à selecção, ao tom, à proporção usadas, apontar exactamente onde é que está a mentira.





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