domingo, 13 de junho de 2010

A grave situação na Turquia, país da NATO

.
A Turquia islamista foi longe demais

Daniel Pipes, National Review Online, 8 de Junho de 2010

Tal como o típico teatro islamista esquerdista com o intuito de retirar a legitimidade a Israel, a frota "Free Gaza" patrocinada pela Turquia no final de Maio foi aborrecidamente repetitiva. Como ilustração de que os israelitas não se dão conta do tipo de guerra que eles têm que travar, o resultado era tristemente previsível. Contudo, como exposição da política da Turquia e um presságio do futuro do movimento islamista, está repleta de novidades e de significado.

Alguns antecedentes: Após uns 150 anos de vacilantes esforços para a modernização, em 1923 o Império Otomano entrou finalmente em colapso, sendo substituído pela República da Turquia, dinâmica, com orientação pro-ocidental, fundada e governada pelo ex-general otomano Kemal Atatürk. No decorrer dos quinze anos seguintes, até à sua morte em 1938, Atatürk impôs um programa de ocidentalização tão rigoroso que em dado momento mandou substituir os tapetes nas mesquitas por assentos parecidos com os das igrejas. Embora a Turquia seja cem porcento muçulmana, ele insistiu num estado secular puro.

Os melhores amigos? Erdoğan (à esquerda) com Ahmadinejad.

Atatürk nunca conseguiu trazer para o seu lado a totalidade da população turca e, com o passar do tempo, a sua república laica teve de agradar a um número crescente de devotos muçulmanos. No entanto, o preceito de Atatürk persistiu pelos anos de 1990 protegido pelo oficialato das forças armadas, que tomou como prioridade manter viva a sua memória e o secularismo arraigado.

Os islamistas alcançaram a representação parlamentar pela primeira vez no início dos anos de 1970 quando seu líder, Necmettin Erbakan, já tinha servido três vezes como vice-primeiro-ministro. Enquanto os partidos políticos turcos inseridos na corrente predominante desperdiçavam a sua legitimidade com uma deplorável mistura de egoísmo e corrupção, Erbakan persistiu até se tornar primeiro ministro por um ano (1996-1997), até que as forças armadas o puseram para fora.

Alguns dos tenentes mais ágeis e ambiciosos de Erbakan, liderados por Recep Tayyip Erdoğan, formaram um novo partido político islamista em Agosto de 2001, o Adalet ve Kalkınma Partisi ou AKP. Cerca de um ano mais tarde, conquistou a impressionante percentagem de 34 porcento de maioria relativa e, devido às excentricidades do sistema eleitoral turco, passou a controlar o parlamento com 66 porcento dos lugares.

Erdoğan tornou-se primeiro-ministro e, em consequência de um bom governo, o AKP ganhou um aumento substancial de votos e a reeleição em 2007. Com o mandato renovado e com as forças armadas cada vez mais marginalizadas, ele prosseguiu de forma agressiva na elaboração de teorias conspiratórias falsas, multou um comentador político em 2,5 mil milhões de dólares, gravou em vídeo o líder da oposição numa situação sexual comprometedora e agora planeia alterar a constituição.

A política externa, nas mãos do ministro Ahmet Davutoğlu, que aspira que a Turquia recupere a antiga liderança no Proximo-Oriente, exagerou de modo ainda mais grosseiro. Ankara não só adoptou uma abordagem mais beligerante em relação a Chipre como também, de forma imprudente, se introduziu em assuntos delicados como a escalada nuclear iraniana e o conflito israelo-árabe. Mais surpreendente de tudo tem sido o seu apoio a IHH, uma "sociedade beneficente" turca com relações documentadas com a Al-Qaeda.

Embora o comportamento irresponsável de Ankara tenha implicações inquietantes em relação ao Proximo-Oriente e ao Islão, também tem um aspecto tranquilizador. Os turcos têm estado na vanguarda do desenvolvimento do que eu chamo de Islamismo 2.0, a versão popular, legítima e não violenta do que o Aiatolá Khomeini e Osama bin Laden tentaram alcançar de forma violenta através do Islamismo 1.0. Eu previ que a forma traiçoeira do islamismo de Erdoğan "poderia ameaçar mais ainda do que a brutalidade do 1.0 a vida civilizada".

Fethullah Gülen desaprova. Contudo, a sua desistência no que diz respeito à modéstia e à cautela anterior sugere que os islamistas não conseguem resistir, que a criminalização inerente ao islamismo necessita afinal emergir, que a variante 2.0 necessita de reverter às suas origens do 1.0. Conforme afirma Martin Kramer, "quanto mais afastados os islamistas estiverem do poder, mais comedidos serão, e o mesmo vale no sentido inverso". Isso significa que é possível que o islamismo é um inimigo menos assustador, por duas razões.

Primeira, a Turquia hospeda o movimento islamista mais sofisticado do mundo, que inclui não apenas o AKP, mas também o movimento popular Fethullah Gülen, a máquina de propaganda Adnan Oktar, e muito mais. A nova belicosidade do AKP causou dissensão; Gülen, por exemplo, condenou publicamente a farça "Free Gaza", indicando que poderia ocorrer uma luta interna debilitante relativamente a tácticas.

Segundo, embora anteriormente apenas um pequeno grupo de analistas reconhecesse a abordagem islamista de Erdoğan, agora esse facto tornou-se claro e evidente para que o mundo inteiro pudesse ver. Erdoğan descartou gratuitamente a sua imagem cuidadosamente produzida de um "democrata muçulmano" pro-ocidental, tornando muito mais fácil tratá-lo como o aliado de Teerão-Damasco, o que realmente ele é.

Como quer Davutoğlu, a Turquia voltou ao centro do Proximo-Oriente e da uma nação no sentido árabe. Assim sendo, a Turquia já não merece ser membro integral da NATO e os partidos de oposição merecem apoio.


Original em inglês: Islamist Turkey Overreaches



.



Sem comentários: