terça-feira, 8 de setembro de 2015


Invasão da Europa


Pedro Rainho, Jornal i, 5 de Setembro de 2015

Serviços de informação não têm forma de controlar quem chega ao continente. Terroristas «vão aproveitar a onda» para entrar, diz especialista.

A Europa prepara-se para acolher centenas de milhares de refugiados. Vários países – e as suas autarquias, municípios, organizações e organismos públicos e privados – manifestaram, nos últimos dias, disponibilidade para dar o seu contributo e minorar a catástrofe humana que se foi avolumando na costa europeia, com a chegada de migrantes em sucessivas vagas. Esses braços europeus abertos são, ao mesmo tempo, uma carta-branca. Ao acolher os refugiados, a Europa escancara também as portas à ameaça do terrorismo.

No início desta semana, a estação de televisão búlgara NOVA TV deu conta da detenção de cinco supostos refugiados que tentavam cruzar a fronteira entre a Bulgária e a Macedónia. Para escapar a um controlo fronteiriço mais apertado, os homens, entre os 20 e os 24 anos, optaram por fazer a travessia na zona de Gyueshevo e, para isso, contaram com o apoio de um cúmplice que os foi buscar de carro a território macedónio.

Foram detidos por oficiais búlgaros e, nos telemóveis, traziam consigo propaganda do Estado Islâmico – entre o material havia rezas jihadistas e vídeos de decapitações realizados pelos membros do grupo extremista. A sensibilidade do caso obrigou a Agência Estatal Búlgara de Segurança Nacional a entrar em acção e a assumir a investigação.

Até ao momento, não passa de um caso isolado. Mas «é preciso que haja a máxima atenção a estas infiltrações», alerta José Manuel Anes. O especialista em terrorismo considera prioritário que se prossiga com a acção de apoio humanitário aos refugiados que continuam a chegar a território europeu, mas não esconde que as células terroristas a operar em África «vão aproveitar esta onda para entrar na Europa».

Esse é um perigo real. Para já, os Serviços de Informação da República (SIRP) são contidos nas considerações. Fonte oficial das secretas diz ao i que «é prematuro falar sobre a situação num momento em que a operação tem um cariz humanitário». «Nesta fase, não nos devemos pronunciar» sobre as eventuais consequências da entrada de cidadãos estrangeiros em Portugal, sobretudo nas condições em que os refugiados (sírios, na maioria) deverão chegar.

A situação está a ser gerida com as habituais pinças políticas, mas a verdade é que a forma como o processo está a ser politicamente conduzido ao nível da União Europeia suscita fortes preocupações a quem acompanha as questões de segurança interna. Há dois anos que os barcos se aventuram Mediterrâneo adentro, rumo à costa norte do mar. Chegam muitas vezes sem documentos e sem um historial, um «perfil» que os serviços de inteligência possam ter em conta e que lhes permita fazer uma triagem entre quem representa um perigo e quem vem realmente para salvar a própria vida e a dos familiares. «Alguns escaparão ao controlo das autoridades», admite José Manuel Anes.

E, neste momento, a forma de actuação de grupos extremistas como o Estado Islâmico – o «terrorismo individual», como refere Anes – dispensa a existência de um grupo para pôr em prática ataques. «Basta um». O especialista em questões de terrorismo diz, por isso, que «é fundamental a partilha de informação entre os diversos países europeus e entre estes e os países do norte de África».

Aí entra a segunda parte do problema: não existem redes de comunicação sólidas e seguras com muitos dos países de proveniência dos refugiados. Com meio milhão de refugiados em território europeu, sem documentos que os identifiquem e sem serviços de informação do outro lado para dar o devido contexto sobre os focos de perigo, os serviços de informação estão de mãos e braços atados. Em Portugal, o princípio é o de esperar para ver. O número mais elevado em cima da mesa é de três mil refugiados a acolher – onde, como, por quanto tempo são questões ainda sem resposta. A segurança interna só entrará efectivamente em acção quando os refugiados chegarem a território nacional.





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