Pedro Rainho, Jornal i, 5 de Setembro de 2015
Serviços de informação não têm forma de controlar quem chega ao continente. Terroristas «vão aproveitar a onda» para entrar, diz especialista.
A Europa prepara-se para acolher centenas de milhares de refugiados. Vários países – e as suas autarquias, municípios, organizações e organismos públicos e privados – manifestaram, nos últimos dias, disponibilidade para dar o seu contributo e minorar a catástrofe humana que se foi avolumando na costa europeia, com a chegada de migrantes em sucessivas vagas. Esses braços europeus abertos são, ao mesmo tempo, uma carta-branca. Ao acolher os refugiados, a Europa escancara também as portas à ameaça do terrorismo.
Foram
detidos por oficiais búlgaros e, nos telemóveis, traziam consigo propaganda do
Estado Islâmico – entre o material havia rezas jihadistas e vídeos de
decapitações realizados pelos membros do grupo extremista. A sensibilidade do
caso obrigou a Agência Estatal Búlgara de Segurança Nacional a entrar em acção
e a assumir a investigação.
Até ao
momento, não passa de um caso isolado. Mas «é preciso que haja a máxima atenção
a estas infiltrações», alerta José Manuel Anes. O especialista em terrorismo
considera prioritário que se prossiga com a acção de apoio humanitário aos
refugiados que continuam a chegar a território europeu, mas não esconde que as
células terroristas a operar em África «vão aproveitar esta onda para entrar na
Europa».
Esse é
um perigo real. Para já, os Serviços de Informação da República (SIRP) são
contidos nas considerações. Fonte oficial das secretas diz ao i que «é
prematuro falar sobre a situação num momento em que a operação tem um cariz
humanitário». «Nesta fase, não nos devemos pronunciar» sobre as eventuais
consequências da entrada de cidadãos estrangeiros em Portugal, sobretudo nas
condições em que os refugiados (sírios, na maioria) deverão chegar.
A
situação está a ser gerida com as habituais pinças políticas, mas a verdade é
que a forma como o processo está a ser politicamente conduzido ao nível da
União Europeia suscita fortes preocupações a quem acompanha as questões de
segurança interna. Há dois anos que os barcos se aventuram Mediterrâneo
adentro, rumo à costa norte do mar. Chegam muitas vezes sem documentos e sem um
historial, um «perfil» que os serviços de inteligência possam ter em conta e
que lhes permita fazer uma triagem entre quem representa um perigo e quem vem
realmente para salvar a própria vida e a dos familiares. «Alguns escaparão ao
controlo das autoridades», admite José Manuel Anes.
E, neste momento, a forma de actuação de grupos extremistas como o
Estado Islâmico – o «terrorismo individual», como refere Anes – dispensa a
existência de um grupo para pôr em prática ataques. «Basta um». O especialista
em questões de terrorismo diz, por isso, que «é fundamental a partilha de
informação entre os diversos países europeus e entre estes e os países do norte
de África».
Aí entra a segunda parte do problema: não existem redes de comunicação
sólidas e seguras com muitos dos países de proveniência dos refugiados. Com
meio milhão de refugiados em território europeu, sem documentos que os identifiquem
e sem serviços de informação do outro lado para dar o devido contexto sobre os
focos de perigo, os serviços de informação estão de mãos e braços atados. Em
Portugal, o princípio é o de esperar para ver. O número mais elevado em cima da
mesa é de três mil refugiados a acolher – onde, como, por quanto tempo são
questões ainda sem resposta. A segurança interna só entrará efectivamente em
acção quando os refugiados chegarem a território nacional.
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