terça-feira, 8 de setembro de 2015
Rangel tenta emendar o soneto
Heduíno Gomes
Depois da calinada que deu ao afirmar publicamente e de forma implícita que as magistraturas estão às ordens dos executivos — o que corresponde, nas circunstâncias actuais, a dizer que o Sócrates é um prisioneiro político — o Rangel vem agora, em artigo no Observador, «explicar» o que toda a gente sabe, que existe uma influência do executivo na criação de um ambiente favorável ou desfavorável à acção da justiça.
A questão principal da calinada não é saber se isto tem ou não a sua ponta de verdade. A calinada consiste em estar a ajudar o Sócrates e a comprometer os magistrados que corajosamente têm trabalhado no processo. Será preciso ser muito inteligente para perceber isto?
Ao autor da calinada não faço apelo nenhum. Não vale a pena porque já demonstrou amiúde as suas capacidades, incluindo no referido artigo, como veremos. Aos laranjinhas que o defenderam é que eu aqui lanço o apelo para se libertarem do camisolismo e arrumarem a casa, entregando cargos políticos e a comunicação a gente com dois dedos de testa, para que o trabalho político não seja comprometido com calinadas destas e não se dêem argumentos ao inimigo.
Vejamos agora alguns aspectos do artigo de Rangel a tentar emendar o soneto. Não se pode dizer que a emenda seja pior do que o soneto. De facto, Rangel apenas tenta tapar o sol com uma peneira e omite o aspecto principal, que é o contexto das suas palavras calinóticas. O soneto nem melhorou nem piorou.
1 — Reduz os críticos da sua calinada ao PS e a comentadores. Como ele se engana!
2 — Atribui aos críticos o pecado de não terem lido Montesquieu, que inclui «o poder judicial no estudo do sistema de governo». Assim, Rangel tenta transportar a calinada política para o terreno da ciência política. Se alguém o critica é porque não leu Montesquieu... E quem leu Marx sobre a super-estrutura jurídica poderá criticar Rangel? E o senhor La Palisse?
3 — Escreve Rangel: «O abuso de menores sempre foi crime, mas, apesar de denúncias e indícios vários com décadas, nunca foi perseguido como agora.» Será verdade? Está a esquecer-se do caso Casa Pia ou a valorizar os pseudo-abusos de pais educarem os seus filhos por critérios diferentes das Manuelas Eanes?
4 — Hoje, existe na sociedade portuguesa uma maior consciência da corrupção e exigência de justiça. É um facto. A quem é que Rangel atribui o mérito desta realidade? Não é à imprensa que denunciou casos. Não é às redes sociais que ainda foram mais longe do que a imprensa. Calcule-se, é ao «programa de ajustamento»! Aqui não sabemos se estamos no reino do equívoco ou no da paranóia. Só adiantados mentais conseguem atingir!
5 — E Rangel descreve o cenário onde largou a calinada: «A Universidade de Verão é a iniciativa mais consistente de formação política existente em Portugal. Um mérito quase exclusivo de Carlos Coelho.» Estas frases deste fala-barato da classe política atestam bem a superficialidade e a mediocridade a que estão sujeitos os jovens do PSD. Facto evidente é nunca — mas mesmo nunca — o PSD nem qualquer outro partido do chamado arco da governabilidade ter dado qualquer formação aos seus membros. Se para Rangel a iniciativa de Coelho é a melhor...
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário