segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016


Uma experiência chamada Portugal


Alberto Gonçalves, Diário de Notícias, 31 de Janeiro de 2016

Se bem percebi, o alegado governo que nos caiu em cima enviou à Comissão Europeia um rascunho do Orçamento do Estado, o qual, segundo quem sabe do assunto, ganharia em ter sido produzido por dois cangurus munidos de uma «folha» de Excel. A CE, horrorizada com tamanho caldo de inépcia, trafulhice, alucinação e certificada desgraça, devolveu o papel acompanhado de uma carta que se esforça por manter a polidez protocolar embora não esconda certa falta de paciência para as artimanhas de burgessos.

O dr. Costa e os serviçais do governo reagiram através da desvalorização da carta, até porque, garantiam eles, as objecções da CE prendem-se com ligeirezas técnicas e, por favor não se engasguem, «não têm relevância política». Em simultâneo, um teórico do «costismo» (o equivalente em sofisticação ao atendedor de chamadas do professor Bambo) acusou a CE de «tentar tramar o governo português». A acreditar nos socialistas, o Conselho Económico e Social, o Conselho das Finanças Públicas, a Unidade Técnica de Apoio Orçamental, quatro agências de rating, a UEFA e um vizinho meu também aderiram à conspiração.

No que toca aos partidos comunistas que de facto mandam no circo, e que nem com a queda do muro aproveitaram para fugir do hospício, instigam o dr. Costa a enfrentar a «Europa dos interesses» com, engasguem-se à vontade, firmeza. Catarina Martins avisa que a CE «está a assaltar-nos», mas na verdade o arranjinho que a dra. Catarina integra é que o fez em Outubro – e agora julgasse ser igualmente fácil assaltar os contribuintes alemães. Para distinguir o PCP do Bloco, o sr. Jerónimo repete a lengalenga do Bloco.

De seguida, o dr. Costa, cuja fluência na própria língua de facto levanta interrogações acerca da comunicação com estrangeiros, voltou à carga com redobrado delírio, mais a consideração de que as previsões do governo são «conservadoras e realistas» e a denúncia de que Passos Coelho – o «senhor primeiro-ministro», nas palavras do alegado – enganou Bruxelas.

Entretanto, há infelizes que com as melhores intenções vão à televisão comentar a «situação» como se a «situação» merecesse comentários. É, evidentemente, uma trabalheira inglória: nada que saia das infantis cabeças que nos governam (força de expressão) exibe um pingo de racionalidade e pode ser levado a sério. Séria só a desgraça em que concorrem para nos deixar, de que eles escaparão com típica impunidade. E que nós pagaremos com típica resignação e, desconfio, sofrimento inédito. Portugal é hoje uma experiência, à escala real, para averiguar quanto tempo um país resiste nas mãos de transtornados. Eis uma previsão conservadora e realista: pouco.





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