Daniel Pipes, Washington Times, 7 de Junho de 2016
Dois romances franceses de grande repercussão, diferentes quanto ao tom e ao timing, retratam duas influentes visões de França no futuro. Não se trata apenas de boa leitura (ambos já foram traduzidos para o inglês), juntos estimulam o pensamento sobre a crise da imigração no país e as mudanças culturais.
Jean Raspail (1925-) imagina a invasão racial vinda pelo mar, por meio de jangadas e botes partindo do subcontinente indiano navegando vagarosamente, inexoravelmente rumo ao Sul de França. No Le Camp des Saints (O Campo dos Santos, 1973), primordialmente documenta a impotente reacção francesa, tomada pelo pânico, à medida que a horda (palavra usada 34 vezes) «continua engrossando ainda mais as suas fileiras».
É uma perfeita fantasia anti-utópica sobre a raça branca e a vida europeia que corresponde aos receios articulados por ninguém menos que Charles de Gaulle, o principal político de França pós-guerra, que dava cordial acolhimento a cidadãos franceses não brancos, «desde que permanecessem uma pequena minoria. Senão, a França deixará de ser a França. Afinal de contas, somos todos, acima de tudo, um povo europeu de raça branca».
Camp também antecipa a noção da «Grande Substituição» (Le Grand Remplacement) conceptualizada pelo intelectual francês Renaud Camus, que antecipa a rápida substituição «do histórico povo do nosso país por povos de origem imigratória que são em grande medida não europeus». É o mesmo receio, a grosso modo – dos imigrantes passarem o povo francês autóctone para segundo plano e apoderarem-se do país – que inspira o partido Frente Nacional, que já atinge índices de 30% dos votos nas pesquisas de opinião e continua crescendo.
Michel Houellebecq (1956-) conta a história, não de um país (França), mas de um indivíduo (François) em estado de Soumission (Submissão, 2015). François é um professor já cansado, decadente, do movimento decadente da literatura francesa. Não tem família, amigos nem ambição; embora tenha somente quarenta e poucos anos, a sua vontade de viver deteriorou-se e chegou ao tédio a ponto de se alimentar de pratos prontos e uma sucessão de troca de parceiros sexuais.
Se por um lado o romance de 1973 nunca menciona a palavra Islão ou muçulmano, em contrapartida o romance de 2015 adapta-se às duas – começando pelo título: Islão que em árabe significa «submissão». Da mesma forma, o primeiro livro tem como foco a raça enquanto o segundo praticamente não toma conhecimento dela (a prostituta favorita de François é do Norte de África). A tomada do poder da primeira obra termina de forma diabólica, a outra de forma agradável. O primeiro livro é um tratado político apocalíptico disfarçado de entretenimento, o segundo apresenta uma visão literária e sardónica no tocante à perda de força de vontade sem também expressar qualquer ânimo em relação ao Islão ou aos muçulmanos. O primeiro documenta uma agressão o segundo um consolo.
Os romances capturam duas importantes e praticamente contraditórias correntes do pós-guerra: a atracção exercida pela Europa livre e rica nos povos remotos e empobrecidos, principalmente muçulmanos; e a atracção de um Islão vigoroso em vez de uma Europa pós-cristã enfraquecida. Em ambos os casos, a Europa – apenas 7% do território mundial, contudo a região dominante por cinco séculos, de 1450 a 1950 – está prestes a perder os seus costumes, cultura e convenções sociais, tornando-se uma mera extensão ou até dependente do Norte de África.
Os romances sugerem que a alarmante preocupação expressada há décadas (multidões de pessoas furiosas e violentas de pele escura) tornam-se um lugar comum e até benignas (as universidades do Médio Oriente pagam salários mais altos). Sugerem que o clima de pânico já passou, sendo substituído por uma época de graciosa capitulação.
Um hiato de quarenta anos separa os dois livros; se saltarmos mais 42 anos, que tipo de história poderá contar um romance futurista publicado em 2057? Intelectuais como Oriana Fallaci, Bat Ye'or e Mark Steyn assumiriam a vitória do Islão e a caça aos poucos remanescentes franceses da fé cristã. A minha previsão, no entanto, é praticamente contrária a essa: um relato que assume o fracasso da grande substituição de Camus, imaginando a violenta repressão aos muçulmanos (nas palavras de Claire Berlinski) «libertando os franceses da ofuscação da História europeia» acompanhada pela reafirmação nativista francesa.
Original em inglês: Who Will Write France's Future?
Tradução: Joseph Skilnik
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