domingo, 13 de fevereiro de 2011

Pois é...

Carmindo Mascarenhas Bordalo *
A horrorosa morte do cronista social Carlos Castro devia ser aproveitada para a sociedade portuguesa reflectir sobre um dos fenómenos em que assenta o chamado casting couch.
O casting couch é a expressão que traduz o fenómeno da prestação de favores sexuais em troca de benefícios profissionais.
Castro acabou por sofrer as consequências de se ter envolvido numa situação extrema de casting couch.
É evidente que o rapaz que o matou queria usar o seu corpo para ascender na carreira artística. Castro aproveitou isso para conseguir aquilo que, obviamente, não conseguiria de outra forma: companhia sexual de alguém 44 anos mais jovem.
A situação não é nova, bem pelo contrário: desde tempos imemoriais que rapazes da província afluem a Lisboa e tornam-se amantes de homens muito mais velhos. Muitas vezes, com o passar dos anos, essas situações até evoluem para algo próximo de relações familiares. O actual presidente de um importante instituto público, privado de condições materiais desde tenra idade, esteve envolvido num esquema dessa natureza. O ex-presidente de um importante clube de futebol também. Quem não se quiser fazer de parvo tem de admitir que estes casos pululam.
Nos anos 50, Carlos Burnay apareceu morto, ao que tudo indica pelas mãos de um empregado com quem mantinha uma relação do género. Devido a esse caso, na época, o termo «peixinho do mar» significava homossexual.
Até nas consequências, portanto, o caso não é novo.
O casting couch está enraizado em Portugal, como beber vinho ou ver futebol. A política, o meio artístico e até o mundo universitário estão pejados disso.
Conto duas histórias a propósito do casting couch universitário.
Era eu um jovem assistente a começar carreira quando uma aluna, de forma anormal para a época, apareceu com um decote verdadeiramente despropositado. Acabou por passar com um miserável 10, não pela exibição mamária mas porque, apesar de tudo, não fora das piores. Algumas semanas depois, apareceu-me antes de uma tarde de exames, vestida de forma ainda mais ousada, com uma rapariguita envergonhada ao lado. Depois de meio minuto de insinuação reles, apresentou-me a amiga. Verifiquei depois que era uma das alunas que ia a exame. Reprovou, pois não dava uma para a caixa. A outra nunca mais me cumprimentou, certamente ofendida pela desfeita e interrogando-se se os seus dotes só funcionariam algumas vezes... Sei, contudo, que com outros docentes funcionava e que em dias de exame oral a moça não dispensava a indumentária escassa.
Recordo-me de outro episódio, posterior e bem mais grave: uma assistente, conhecida pela forma escandalosa como se apresentava (o que incluia mostrar as cuecas ao sentar-se, enquanto se ria descontroladamente), conseguira sempre belíssimas notas e, logo no início da carreira, era presença assídua em cursos, conferências, grupos de trabalho, etc.. Felizmente nunca lhe dei aulas, mas admirava-me como é que uma pessoa, em tão pouco tempo, ascendera tão depressa, promovida por exigentes colegas meus como se de uma estrela internacional se tratasse. Para mais porque era sabido que, quando abria a boca sem um papel à frente só dizia banalidades. A resposta não tardou: uma vez vi um conhecido académico deste País deixá-la de noite junto a casa dela, ajudando-a a tirar a mala de viagem da bagageira do carro. Era um Domingo à noite.
Se isto é assim nas Universidades, imagine-se nos estúdios de televisão e nos camarins dos modelos.
Não acham estranho que haja tanta incompetência no nosso País?
Não acham estranho que haja sempre tudo para os mesmos?
A explicação é tantas vezes igual e assim será enquanto não houver Justiça que funcione.
Carlos Castro foi apenas um caso com desfecho extremo.

* Professor Catedrático jubilado

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