O livro «Primeira
República Portuguesa e Igreja Católica», de monsenhor João Gonçalves Gaspar,
vai ser lançado a 8 de Março no salão nobre do Teatro Aveirense.
A investigação
editada pela diocese de Aveiro, de que o autor é vigário geral, será
apresentada às 18h30 pelo bispo do Porto, D. Manuel Clemente, que assina o
prefácio.
Prefácio
Agradecemos a
Monsenhor João Gonçalves Gaspar mais este trabalho histórico-religioso, de
grande oportunidade e valia.
Mais este, porque
vem de longe o seu interesse pela temática, bem evidenciado em vários e
preenchidos escritos, com especial relevo para os três volumes que dedicou ao
Bispo Lima Vidal. De grande oportunidade é o presente estudo, na esteira das
comemorações do centenário da implantação da República, que deu azo a muitas
publicações sobre o assunto.
Graças a estas
publicações, temos hoje uma visão muito mais pormenorizada e circunstanciada do
que sucedeu em Portugal nas primeiras décadas do século passado. Pormenorizada,
porque se evidenciaram ou releram fontes fundamentais ou particulares que nem
sempre apareciam, ou eram ignoradas do grande público; circunstanciada, porque
essas mesmas leituras ou releituras, em geral serenas e equilibradas, souberam
situar melhor os depoimentos e as intervenções dos protagonistas de então.
Também aqui este
trabalho de Monsenhor Gaspar nos dá boas contribuições, com referências
documentais que não conhecíamos ou precisavam de integração. E podemos dizer
que o equilíbrio dos seus comentários coincide geralmente com o resultado geral
das referidas publicações do centenário.
E é esta, muito
especialmente, a sua valia. Não nos interessam ajustes de contas com o passado,
mas ajustar o presente à sua memória mais correta. Memória que, mesmo sendo
«colectiva», conjuga sempre realidades marcadamente pessoais. Quanto à
liberdade e à responsabilidade, referem-se sempre a alguém, que pensou e agiu
desta ou daquela maneira, por esta ou aquela razão e a partir desta ou daquela
posição, motivada por estas ou aquelas influências.
Se isto é verdade em
geral, muito mais o é no que à 1ª República concerne. Talvez nunca na história
portuguesa se tenham entrechocado tantos, dentro de ideários mais próximos do
que pareciam: – Quem não queria, por exemplo, «regenerar» Portugal, de 1820 a
1910 e ainda depois? - Não era isso mesmo que o hino adotado e ainda cantado
pretendia, para «levantar hoje de novo o esplendor de Portugal»? Monárquicos ou
republicanos, socialistas ou mesmo anarquistas, entre todos se aspirava a uma
nova alvorada pátria. O problema estava em defini-la: - Voltando à monarquia
tradicional, anterior a 1820-1834, ou aprofundando a constitucional, aliando
melhor monarquia e democracia, como em Inglaterra e noutros reinos? - Com uma
república municipalista e federal, como na Suíça, ou unitária e centralizada,
para levar por diante as mudanças requeridas, vencendo resistências e
oposições?
De tudo isto se
falava e com tudo isto se esgrimia. Mais ainda quando a vontade de mudança ou
alteração profunda das coisas consentia perspectivas demasiado distintas: -
Importava retomar a «alma» portuguesa na sua conotação religiosa e católica,
mesmo na aplicação social que o pontificado de Leão XIII (1878-1903) lhe dera,
ou, muito pelo contrário, havia de se afastar de vez tal conotação, em
obediência à marcha «positivista» da história, que reduzia cada vez mais a
religião ao íntimo da consciência de cada um, sem qualquer transposição pública
da crença?
E quanto ao Estado,
na sua relação com a Igreja: - Devia continuar-se em regime
público-eclesiástico, com a definição religiosa do país e a quase integração da
vida eclesial na administração civil, ou, como o liberalismo católico pretendia
desde os anos vinte em França e depois pela Europa e além dela, era necessário
«libertar» a Igreja da tutela estatal, mesmo que tal levasse à «separação» das
duas esferas?
Estas e outras
polémicas eram muito transversais a todo o campo político, antes e depois de
1910. Havia no «movimento católico português», sobretudo depois de 1870, quem
subscrevesse mais ou menos pontos do liberalismo católico; e houve no
republicanismo triunfante quem defendesse a supervisão estatal da vida
católica, como era o caso do próprio Afonso Costa e da «sua» Lei da Separação…
Assim como houve no campo católico figuras importantes que, mesmo antes de
1910, insistiam na atenção às ciências e aos «progressos do século» (Sena
Freitas, Gomes dos Santos e tantos mais).
Louvo e agradeço o
trabalho de Monsenhor Gaspar, pelo manancial de factos e figuras que muito bem
conjuga e pelo tom geral com que os aprecia e apresenta. É um bom contributo
para nos revermos e perspectivarmos, em sociedade e Igreja.
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