Alberto Gonçalves, Diário
de Notícias, 5 de Julho de 2015
Na sexta-feira, os deputados do Bloco de Esquerda
levantaram cartazes em que se lia «Solidariedade com a Grécia». Como se o gesto
não fosse suficientemente engraçado, submeteram em simultâneo à Assembleia da
República um voto com pedido semelhante. Dado que alguns parlamentares têm
vergonha na cara, o voto acabou rejeitado. Mas ficou a divertidíssima intenção
de condenar as «pressões indevidas que tentam condicionar a escolha livre e
democrática do povo». Em português, isto significa que os gregos são livres de
escolher a maneira de outros os sustentarem. Quanto à liberdade dos outros, o
BE foi omisso. Para cúmulo, que se saiba nenhum dos deputados contribuiu para a
campanha iniciada pelo britânico que, através de crowdfunding, procura ajudar a
pagar os 1,6 mil milhões da dívida grega. Da última vez que vi, a recolha ia
nos 1,6 milhões. Faltava um bocadinho, um bocadinho que, desconfio, não se
alcança com cartazes e votos solidários. Nem com lirismo.
O lirismo dominou o encontro «A crise europeia à
luz da Grécia», debate também realizado na sexta-feira e abrilhantado pela
ausência de divergências. O calibre dos nomes envolvidos explica o estilo e o
consenso: Louçã, Pacheco Pereira, Manuel Alegre, o Prof. Freitas, um economista
da CGTP e, claro, os imparáveis deputados do BE. A bem da síntese, eis o tom
geral: a Europa é uma ditadura (valha-nos Deus); a Grécia simboliza a
democracia (desde tempos imemoriais, para não falar do velho esclavagismo e da
pedofilia clássica); os gregos resistem ao poder do dinheiro (excepto quando é
dado); os gregos, à imagem dos jogadores da bola, levantam a cabeça (excepto
para pedir); os gregos são dignos (na medida em que o parasitismo é um critério
de dignidade); os gregos, em suma, são patriotas – já os alemães que preferem a
Alemanha ou os portugueses que preferem Portugal são traidores. Seja em que
país for, patriota é o sujeito que dá a vida ou, vá lá, levanta um cartaz pela
Grécia.
A Grécia ou, diga-se em nome da exactidão, o
Syriza, o que não é exactamente o mesmo. Há dias, o ministro Varoufakis disse
preferir perder um braço a prejudicar a Grécia. Ora o homem não é maneta e, com
uma perna às costas, nos intervalos das poses para retratos ao piano já
transformou a situação que os gregos viviam há seis meses numa saudade. O
pedaço que falta aos senhores do Syriza é uma cabeça em que caiba coisa
diferente de ideologia, infantilidade, ressentimento, fanatismo e todos os
ingredientes da toleima de que nos lembrarmos.
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